Oitavo dia: O DOM DE PIEDADE (para com Deus)
TODOS - Ó
Deus, fonte de
toda a piedade e santidade, derramai em nossas almas a graça do Espírito Santo e
fazei com que, movidos pelo dom de piedade, tratemos
convosco com a afeição dos filhos muito amados.
LEITOR - Hoje vamos meditar sobre o dom de Piedade,
mas, antes de começar, precisamos fazer um esclarecimento. A palavra piedade,
na linguagem cristã, tem dois sentidos. Significa, por um lado, devoção,
relacionamento afetuoso com Deus, com Maria, com os Anjos e com os santos. Por
outro, significa compaixão, dó, atenção carinhosa aos males, desorientações e sofrimentos
do próximo. Neste dia consideraremos apenas o primeiro sentido. Qual poderia
ser, então, uma primeira definição do dom da Piedade para com Deus? O Papa João
Paulo II diz que é o dom que cura a dureza do nosso coração e o abre à ternura
para com Deus; um dom que cria em nós sentimentos de carinho filial e de
profunda confiança em Deus, a quem vemos como Pai providente e bom. É deste dom
que falava São Paulo, quando dizia: A prova de que sois filhos é que Deus
enviou aos vossos corações o Espírito do seu Filho - o divino Espírito
Santo - que clama “Abá”, Pai! Portanto já não és escravo, mas filho.
O Espírito Santo é o grande fruto da Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo. Ao
redimir-nos, Ele ganhou para nós o dom do Espírito Santo, o mesmo Espírito de
Amor que inundava a sua alma e o fazia invocar seu Pai celestial com essa
palavra aramaica, que São Paulo cita duas vezes: Abá (Pai, Papai,
Paizinho), uma palavra que os primeiros cristãos conservavam e repetiam com
imenso carinho.
TODOS -
Pai nosso, que estais nos Céus e nos nossos corações, concedei-nos o dom de
piedade, que nos ajude a viver como filhos muito amados de Deus; a pensar como
filhos, a vos tratar como filhos, a corresponder ao vosso amor com carinho de
filhos.
LEITOR - Sabem qual é uma das primeiras coisas que
o Espírito Santo nos ajuda a fazer, com o dom de piedade? Pois bem, a primeira
coisa é ensinar-nos a orar, a conversar de maneira íntima e confiada com Deus.
São Paulo diz, na Carta aos Romanos, que nós não sabemos orar como convém,
mas que o Espírito Santo intercede por nós, e nos ajuda a fazer
verdadeira oração, auxiliando-nos com seus gemidos, suas inspirações
inefáveis. É tão fácil cair no engano de fazer uma oração que não seja
verdadeira oração! É o caso, por exemplo, das pessoas que só rezam quando estão
muito preocupadas e aflitas, mas depois se esquecem totalmente de rezar e até
de agradecer; ou dos que caíram na rotina ruim: pessoas que fazem habitualmente
umas rezas por puro costume, mas de modo mecânico, sem pensar no que dizem, nem
colocar o coração em Deus, nem se preocupar por melhorar um pouco. A essa
oração, Santa Teresa chamava “chacoalhar de latas”. E vocês sabem o que é ainda
pior do que isso? É dizer que, como é tão fácil se distrair ao rezar, é melhor
só fazer oração nos momentos em que temos vontade de orar e “sentimos” o
gostinho da oração. Confundem a oração com o bolo de chocolate. A oração deles,
no fundo, é uma “oração de consumo”, quer dizer, que só a fazem quando lhes dá
prazer. Da mesma maneira que assistem cinema, vão passear ou tomam sorvete de
maracujá só quando têm vontade. Essas pessoas confundem a autenticidade com seu
gosto e prazer pessoal. Dizem: Só vou à Missa quando sinto vontade, não quero
ir se não “sinto”; ir sem vontade, só por obrigação, não seria autêntico. Que
erro tremendo! Os maiores atos de amor custam sacrifício, constituem deveres
importantes (por exemplo, a mãe e o pai que sacrificam tantas coisas pelos
filhos) e muitas vezes têm que ser feitos a contragosto, contra as nossas
“vontades”, mas querendo (com uma decisão da vontade). A mãe sacrificada sente
vontade de descansar, de se divertir, mas “dá o sangue” pelo filho. Como é fácil confundir a “vontade” - que é a
capacidade de escolher, decidir e querer o que é bom, ainda que custe - com as
“vontades”, que não passam de desejos volúveis e de caprichos pessoais. Jesus
praticou o máximo ato de amor, que foi dar a vida por nós na Cruz, querendo-o
com toda a força da sua “vontade”, mas sem sentir “vontade” nenhuma: Meu Pai
- dizia no Horto - se é possível afasta de mim este cálice! Todavia não
se faça o que eu quero, mas o que tu queres . Por que
nós não somos capazes de amar Deus assim? Ele, por exemplo, nos chama
na Missa, ele nos
espera na Missa, ele se entrega a nós na Missa…, e nós
respondemos dizendo-lhe que “não temos vontade”. Paremos um
instante para meditar nisso. (pausa de silêncio)
TODOS -
Realmente é absurda essa falsa autenticidade, e é uma tentação forte, não só
para adolescentes e jovens, mas também para pessoas que se julgam muito
maduras. Que Deus nos livre de ter uma religião “de consumo”, esse tipo de
religião que se pratica só para obter vantagens ou para “sentir-se bem”; ou
seja, para agradar-nos a nós mesmos, e não para agradar a Deus.
LEITOR - Acho que seria bom que todos nós, com
muita humildade, pedíssemos a Jesus, como os Apóstolos: Senhor, ensina-nos a
orar! E, com certeza, nosso Senhor nos responderá, como respondeu a eles: Quando
orardes, dizei: Pai. É para isso que o dom de Piedade nos é dado, para que
a oração seja, acima de tudo, um ato de amor filial. Essa oração de filhos é como o
arco-íris: tem muitas cores. Umas vezes basta dizer: “Meu Deus, eu te amo!”.
Outras, limitar-se a ficar diante do sacrário como aquele lavrador que
explicava ao Santo Cura d’Ars o tipo de oração que fazia: “Eu olho para Ele, e
Ele olha para mim”. Outras é ter a simplicidade de pedir o que necessitamos,
sobretudo para a nossa alma e para o bem dos outros. Será que nos esquecemos da
insistência tremenda com que Jesus nos move a pedir: Pedi e recebereis,
buscai e achareis, batei e vos será aberto… Se vós, sendo maus, sabeis dar
coisas boas a vossos filhos, quanto mais vosso Pai celeste dará boas coisas aos
que lhe pedirem. Isso prova que Deus gosta da nossa petição
confiante e a deseja, desde que esteja impregnada do espírito da segunda
petição do Pai-nosso: seja feita
a vossa vontade, assim na terra como no céu. E, ainda
poderíamos acrescentar que é muito bom fazer orações que consistam apenas em
dar graças; ou em ficar lendo e contemplando a vida de Jesus e de Maria; ou em
dizer com simplicidade: “Senhor, que não sei fazer oração”, mas quero
dedicar-vos esse
tempo, mesmo que
seja só para vos fazer companhia e repetir: “Senhor, ajudai-me”. E,
além disso, vamos lembrar como é bom rezar todos os dias as orações da manhã e
da noite; e, sempre que possível, rezar o “Anjo do Senhor” ao meio-dia; e -
tomara que todos nós o fizéssemos - o Terço, que é a oração preferida de Nossa
Senhora: Ela a ama tanto, que a recomendou pessoalmente quando apareceu em
Lourdes e Fátima… Tudo isso nos traz ao
pensamento como Cristo gosta de que sejamos simples de coração: Se não vos
fizerdes como crianças, não entrareis no Reino dos Céus. As
crianças não se complicam, sabem que são fracas, pequenas, que dão
tombos e se machucam, que fazem tolices; mas, depois de umas lagriminhas nos
braços da mãe ou do pai, voltam a brincar contentes, porque
sabem que são queridas e se sentem protegidas; elas confiam totalmente nos pais. Pois, olhem, justamente
essa confiança filial é um dos frutos específicos do dom de Piedade, como
recorda João Paulo
II, com umas
palavras que citávamos anteriormente: o dom de Piedade - diz o papa - enriquece
a alma “com
sentimentos de profunda confiança para com Deus, experimentado como Pai
Providente e Bom”. É maravilhoso constatar que essa confiança pode
ser vivida a cada hora, a cada minuto da nossa vida, da maneira mais simples do
mundo, exercitando a fé na Providência, compreendendo que nosso Pai Deus nos
acompanha com carinho a cada instante, como dizia Jesus: Não vos inquieteis;
vosso Pai vê; vosso Pai sabe; não cai um passarinho do ninho sem a sua licença.
Sim, Deus nos
acompanha com zelo amoroso e, muitas vezes, as horas em que ele está
mais perto de nós são justamente aquelas em que - por causa de um sofrimento, de uma
contrariedade - achamos que nos abandonou… mas, como
dizia São Paulo: Deus faz
concorrer todas as coisas para o bem daqueles que o amam. Por isso
nos ajuda tanto fazer muitos atos de presença de Deus - “Senhor, creio que
estás aqui, que me vês, que me ouves” - atos de fé e amor que nos movem a
oferecer a Deus tudo o que fazemos, e, em consequência, a realizá-lo com a
maior perfeição possível: com amor, com capricho. Isso é viver o dom de piedade
nas menores coisas de cada dia.
TODOS -
Divino Espírito Santo, concedei-nos o dom de piedade, para que possamos
experimentar a imensa alegria de viver como filhos de Deus, de nos sentirmos
filhos muito queridos de um Pai todo-poderoso que nos vê, que nos ama e nos
escuta, e que nos acompanha em cada um dos nossos passos. Que saibamos cumprir
cada dever, cada tarefa, mesmo as muito pequenas, com perfeição de amor, e
oferecê-las a Deus desde que amanhece o dia.
LEITOR - Com isso, penso que
podemos encerrar este oitavo dia da novena. Eu sugeriria, como
propósito concreto, prepararmos cada um de nós com carinho - inclusive
por escrito - um plano de vida espiritual, em que fiquem definidas, com seus
horários, as
orações e leituras espirituais que nos propomos a fazer diariamente; e também
os sistemas práticos de lembrar-nos mais da presença de Deus ao
longo do dia, como, por exemplo, orações breves, jaculatórias, olhares à
imagem de Cristo e da Virgem Santíssima, etc. E me parece
bem próprio deste dia, em que meditamos sobre o dom de Piedade, terminar
rezando um Pai nosso.
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