Caros leitores, hoje o Santo
Padre Bento XVI presidiu Missa Solene na Praça de São Pedro, abrindo a XIII
reunião do Sínodo dos Bispos. Dentro da celebração, o papa declarou como
doutores da Igreja dois santos: São João de Ávila, que viveu por volta do ano
1500 e Santa Hildegarda de Bingen, que viveu na Alemanha Medieval.
Abaixo, publicamos a homilia
do Santo Padre. A referência é do site da Santa Sé.
Veneráveis Irmãos
Queridos irmãos e irmãs,
Com esta solene concelebração
inauguramos a XIII Assembléia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que tem
como tema: A
Nova Evangelização para a transmissão da fé cristã. Esta temática
responde a uma orientação programática para a vida da Igreja, de todos os seus
membros, das famílias, comunidades, e das suas instituições. Tal perspectiva se
reforça pela coincidência com o início do Ano da Fé, que terá lugar na próxima
quinta-feira, dia 11 de outubro, no 50º aniversário da abertura do Concílio
Ecumênico Vaticano II. Dirijo a minha cordial saudação de boas-vindas, cheia de
gratidão, a vós que viestes formar parte nesta Assembléia sinodal, em especial,
ao Secretário-Geral do Sínodo dos Bispos e aos seus colaboradores. Estendo a
minha saudação aos delegados fraternos de outras Igrejas e Comunidades
Eclesiais, e a todos os presentes, convidando-os a acompanhar com a sua oração
diária, os trabalhos que realizaremos nas próximas três semanas.
As leituras bíblicas, que
compõem a Liturgia da Palavra deste domingo, nos oferecem dois pontos
principais de reflexão: o primeiro sobre o matrimônio, que tratarei adiante; e
o segundo sobre Jesus Cristo, que abordarei em seguida. Não temos tempo para
comentar esta passagem da Carta aos Hebreus, mas devemos, no início desta
Assembléia sinodal, aceitar o convite para fixar o olhar no Senhor Jesus,
«coroado de glória e honra, por ter sofrido a morte» (Hb
2,9). A Palavra de Deus nos coloca diante do crucificado glorioso, de modo que
toda a nossa vida e, em particular, o compromisso desta assembléia sinodal, se
desenrole presença d’Ele e à luz do seu mistério. A evangelização, em todo
tempo e lugar, teve sempre como ponto central e último Jesus, o Cristo, o Filho
de Deus (cf. Mc
1,1); e o Crucificado é por excelência o sinal distintivo de quem anuncia o
Evangelho: sinal de amor e de paz, chamada à conversão e à reconciliação.
Sejamos nós, Venerados Irmãos, os primeiros a ter o olhar do coração dirigido a
Ele, deixando-nos purificar pela sua graça.
Queria agora refletir,
brevemente, sobre a «nova evangelização», relacionando-a com a evangelização
ordinária e com a missão ad gentes. A Igreja existe para evangelizar. Fiéis ao
mandamento do Senhor Jesus Cristo, seus discípulos partiram pelo mundo inteiro
para anunciar a Boa Nova, fundando, por toda a parte, comunidades cristãs. Com
o passar do tempo, essas comunidades tornaram-se Igrejas bem organizadas, com
numerosos fiéis. Em determinados períodos da história, a Divina Providência
suscitou um renovado dinamismo na ação evangelizadora na Igreja. Basta pensar
na evangelização dos povos anglo-saxões e eslavos, ou na transmissão do
Evangelho no continente americano, e, em seguida, nos distintos períodos missionários
junto dos povos da África, Ásia e Oceania. Sobre este pano de fundo dinâmico,
apraz-me também dirigir o olhar para as duas figuras luminosas que acabo de
proclamar Doutores da Igreja: São João de Ávila e Santa Hildegarda de Bingen.
Também nos nossos tempos, o Espírito Santo suscitou na Igreja um novo impulso
para proclamar a Boa Nova, um dinamismo espiritual e pastoral que encontrou a
sua expressão mais universal e o seu impulso mais autorizado no Concílio
Ecumênico Vaticano II. Este renovado dinamismo de evangelização produz uma
influência benéfica sobre os dois "ramos" concretos que desenvolvem a
partir dela, ou seja, por um lado, a missio ad gentes, isto é, a proclamação do Evangelho
para aqueles que ainda não conhecem a Jesus Cristo e a Sua mensagem de
salvação; e, por outro lado, a nova evangelização, destinada principalmente às
pessoas que, embora batizadas, se distanciaram da Igreja e vivem sem levar em
conta prática cristã. A Assembléia sinodal que se abre hoje é dedicada a essa
nova evangelização, para ajudar essas pessoas a terem um novo encontro com o
Senhor, o único que dá sentido profundo e paz para a nossa existência; para
favorecer a redescoberta da fé, a fonte de graça que traz alegria e esperança
na vida pessoal, familiar e social. Obviamente, esta orientação particular não
deve diminuir nem o impulso missionário, em sentido próprio, nem as atividades
ordinárias de evangelização nas nossas comunidades cristãs. Na verdade, os três
aspectos da única realidade de evangelização e completam e se fecundam
mutuamente.
Neste sentido, o tema do
matrimônio, que nos ofereceu o Evangelho e a primeira leitura, merece uma
atenção especial. A mensagem da Palavra de Deus pode ser resumida na expressão
contida no livro do Gênesis e retomada pelo próprio Jesus: «Por isso, o homem
deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e eles serão uma só carne» (Gn 2,24,
Mc
10,7-8). O que significa hoje para nós essa palavra? Parece-me que nos convida
a nos tornarmos mais conscientes de uma realidade já conhecida, mas talvez não
totalmente apreciada, ou seja, que o matrimônio se constitui, em si mesmo, um
Evangelho, uma Boa Nova para o mundo de hoje, em particular para o mundo
descristianizado. A união do homem e da mulher, o ser «uma só carne» na
caridade, no amor fecundo e indissolúvel, é um sinal que fala de Deus com
força, com uma eloqüência que hoje se torna ainda maior porque, infelizmente,
por diversas razões, o matrimônio, justamente nas regiões de antiga tradição
cristã, está passando por uma profunda crise. Não é uma coincidência. O
matrimônio está ligado à fé, não num sentido genérico. O matrimônio se
fundamenta, enquanto união do amor fiel e indissolúvel, na graça que vem do
Deus Uno e Trino, que em Cristo nos amou com um amor fiel até a Cruz. Hoje, somos
capazes de compreender toda a verdade desta afirmação, em contraste com a
dolorosa realidade de muitos matrimônios que, infelizmente, acabam mal. Há uma
clara correspondência entre a crise da fé e a crise do matrimônio. E, como a
Igreja afirma e testemunha há muito tempo, o matrimônio é chamado a ser não
apenas objeto, mas o sujeito da nova evangelização. Isso já se vê em muitas
experiências ligadas a comunidades e movimentos, mas também se observa, cada
vez mais, no tecido das dioceses e paróquias, como demonstrou o recente
Encontro Mundial das Famílias.
A chamada universal à
santidade é uma das idéias chave do renovado impulso que o Concílio Vaticano II
deu à evangelização que, como tal, aplica-se a todos os cristãos (cf. Lumen gentium,
39-42). Os santos são os verdadeiros protagonistas da evangelização em todas as
suas expressões. Eles são, em particular, também os pioneiros e os
impulsionadores da nova evangelização: pela sua intercessão e exemplo de vida,
atentos à criatividade que vem do Espírito Santo, eles mostram às pessoas,
indiferentes ou mesmo hostis, a beleza do Evangelho e da comunhão em Cristo; e
convidam os fiéis, por assim dizer, tíbios, a viverem a alegria da fé, da
esperança e da caridade; a redescobrirem o «gosto» da Palavra de Deus e dos
Sacramentos, especialmente do Pão da Vida, a Eucaristia. Santos e santas
florescem entre os missionários generosos que anunciam a Boa Nova aos
não-cristãos, tradicionalmente nos países de missão e atualmente em todos os
lugares onde vivem pessoas não cristãs. A santidade não conhece barreiras
culturais, sociais, políticas ou religiosas. Sua linguagem - a do amor e da
verdade - é entendida por todos os homens de boa vontade e lhes aproxima de
Jesus Cristo, fonte inesgotável de vida nova.
Neste ponto, detenhamo-nos por
um momento para admirar os dois santos que hoje foram agregados ao grupo seleto
dos Doutores da Igreja. São João de Ávila viveu no século XVI. Profundo
conhecedor das Sagradas Escrituras, era dotado de um ardente espírito
missionário. Soube adentrar, com uma profundidade particular, nos mistérios da
Redenção operada por Cristo para a humanidade. Homem de Deus, unia a oração
constante à atividade apostólica. Dedicou-se à pregação e ao aumento da prática
dos sacramentos, concentrando seus esforços para melhorar a formação dos
futuros candidatos ao sacerdócio, dos religiosos, religiosas e dos leigos, em
vista de uma fecunda reforma da Igreja.
Santa Hildegarda de Bingen,
importante figura feminina do século XII, ofereceu a sua valiosa contribuição para
o crescimento da Igreja do seu tempo, valorizando os dons recebidos de Deus e
mostrando-se uma mulher de grande inteligência, sensibilidade profunda e de
reconhecida autoridade espiritual. O Senhor dotou-a com um espírito profético e
de fervorosa capacidade de discernir os sinais dos tempos. Hildegard nutria um
grande amor pela a criação, cultivou a medicina, a poesia e a música. Acima de
tudo, sempre manteve um amor grande e fiel a Cristo e à sua Igreja.
O olhar sobre o ideal da vida
cristã, expressado na chamada à santidade, nos encoraja a ver com humildade a
fragilidade de muitos cristãos, antes, o seu pecado, pessoal e comunitário, que
se apresenta como um grande obstáculo para a evangelização; e nos encoraja a
reconhecer a força de Deus que, na fé, vem ao encontro da fraqueza humana.
Portanto, não se pode falar da nova evangelização sem uma disposição sincera de
conversão. Deixar-se reconciliar com Deus e com o próximo (cf. 2 Cor 5,20)
é a via mestra da nova evangelização. Só purificados, os cristãos podem
encontrar o legítimo orgulho da sua dignidade de filhos de Deus, criados à Sua
imagem e redimidos pelo sangue precioso de Jesus Cristo, e podem experimentar a
sua alegria, para compartilhá-la com todos, com os de perto e os de longe.
Queridos irmãos e irmãs,
confiamos a Deus o trabalho da Assembléia sinodal com o sentimento vivo da
comunhão dos santos invocando, em particular, a intercessão dos grandes
evangelizadores, dentre os quais queremos incluir com grande afeto, o Beato
Papa João Paulo II, cujo longo pontificado foi também um exemplo da nova
evangelização. Colocamo-nos sob a proteção da Virgem Maria, Estrela da nova
evangelização. Com ela, invocamos uma especial efusão do Espírito Santo, que
ilumine do alto a Assembléia sinodal e torne-a fecunda para o caminho da
Igreja, hoje no nosso tempo.
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